FILOSOFIA DO BLOCO

BLOCO DA CANALHA: A VIL RALÉ QUE COSPE NO CHÃO INVADE O CARNAVAL DE RUA DA CIDADE VELHA

Numa mistura de bom humor e um dose de sátira o “Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no cão” saiu no seu primeiro ano de carnaval pelas ruas do bairro da Cidade Velha em Belém. O cortejo ocorreu no dia 27 de janeiro e levou pra rua um grupo pequeno mais muito alegre de brincantes que caminharam dançando e cantando antigas marchinhas carnavalescas e a marcha oficial do Bloco, que tinha como tema este ano o PAC. O bloco saiu do bar Le Chat Noir, na Avenida 16 de Novembro com Triunvirato por volta das 18 h e se dirigiu para a Praça do Carmo onde ao encontrar outros blocos carnavalescos encerrou seu cortejo. Tudo começou como a maioria dos blocos de carnaval, como uma grande brincadeira. Um grupo de amigos, quase todos ex-estudantes do curso de história da UFPa, resolveu aproveitar os seus constantes encontros boêmios para fundar um bloco carnavalesco. Com um mínimo de organização contrataram uma bandinha, um carro-som, conseguiram apoio para cartazes e panfletos e colocaram o bloco na rua, literalmente. O nome do bloco decorre ainda dos tempos de universidade. Após as aulas o mesmo grupo de amigos costumavam se encontrar nos botecos das proximidades da UFPa, no Guamá. Influenciados pelas aulas de história e discutindo sobre a história do Brasil costumavam brindar “à canalha: a vil ralé que cospe no chão”, uma das denominações que a elite do século XIX usava para se referir preconceituosamente ao povo, assim como outros termos como: “as classes perigosas”, “o populacho”, “a turba”, “o povinho”, etc. De tanto brindarem à ralé, ao povinho, às classes perigosas e principalmente à canalha o grupo acabou ficando conhecido como A Canalha. Daí que, anos mais tarde, o bloco carnavalesco recebeu o nome de "Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão". A ironia, a sátira e o bom humor ficaram por conta da marchinha carnavalesca, de autoria de Osvaldo Santos e Tony Leão, que tinha como tema o PAC. Mas não era o mesmo PAC que estamos acostumados a ouvir falar pelos jornais, o Plano de Aceleração do Crescimento do governo federal. O PAC do Bloco da Canalha é, na verdade, o Plano de Aceleração da Canalha, que poderia muito bem ser traduzido como Plano de Aceleração da Ralé, ou do Povinho, ou das Classes Perigosas, ou do Populacho, etc. Neste plano o carnaval, como momento de subversão da ordem se torna a ocasião para a canalha “acelerar o seu crescimento” já que, como diz a letra da marchinha, todos os impostos serão gastos no carnaval: Plano de Aceleração Canalha/ Neste plano você não se vai se dar mal/ Já que todos os recursos/ Serão gastos no carnaval/ Plano de Aceleração Canalha/ Nosso PAC não é nada mal/ Pois no PAC da canalha/ CPMF vai toda pro carnaval/ PAC, PAC, PAC, PAC!/ Plano de Aceleração Canalha/ PAC, PAC, PAC, PAC/ E o carnaval de nossa gentalha... Ano que vem, informam os organizadores, o “Bloco da Canalha: a vil ralé que cospe no chão” sairá novamente no carnaval, com uma bandinha tocando marchinhas antigas e uma nova marchinha oficial, com novo tema a ser ainda escolhida pelos integrantes. E desde já convidam a todos: já que o carnaval é hora de subverter a ordem, hora da farra, hora da turba ir à rua, da balburdia organizada - já que “me organizando posso desorganizar e desorganizando posso me organizar”, como diria Chico Science - momento no qual bulhas, vozerias, batuques, carimbós e sambas são permitidos. É também a hora que a canalha, a vil ralé que cospe no chão, que fica calada o ano todo, dá passagem pra ironia e pro carnaval.

Tony Leão

A CANALHA, POR RAQUEL COSTA

"Talvez eu devesse falar da canalha, desse povo que enche os bares movidos a boêmia e alcool, desse grupo estranho e perfeitamente normal. Os canalhas em geral se entendem e seguem os mesmos ritmos. Alguns se definem como tal e ditam regras e criam conceitos e enquadram o que é ser canalha. O que são os canalhas, se mil traços os une e um milhão os separa? Seria uma filosofia barata? (mas há os práticos demais?) um certo projeto de vida? (todos fatalmente mudam de opinião) um mero grupo de colegas? (talvez). A canalha é por definição aquilo que se vive, se é, se quer ser. Mais que uma brincadeira da juventude, eleva acima da mediocridade atos banais e corriqueiros. À espera do manifesto canalhista, só posso dizer da canalha que quem não conhece não sente falta, mas quem passou por ela e sobreviveu vai sempre se lembrar das figuras hilárias que geralmente embriagadas deram às falas e ações naturais uma cor especial."


Raquel Costa / 2000


2 comentários:

  1. A Canalha, para mim, foi e é uma dose de alegria, poesia e juventude nas veias(independente da idade que se tem)
    Eu amo essa galera.

    ResponderExcluir
  2. Valeu Idalécio, vc é demais...Saudades!!!

    ResponderExcluir